- Ah! Professora, isto é ONOUM!
Como vocês podem ver as tradições africanas, por aqui estão bem preservadas, inclusive no nome do jogo, talvez por influência dos muitos quilombos que compõe o município. Nenhuma criança demonstra qualquer sintoma de vítima de preconceito racial, uma maioria negra facilita a coisa – o meu cabelo liso e vermelho talvez seja uma das atrações da sala de aula, todos passam a mão e perguntam se é natural. Digo que não, não é natural! - É “cereja-da-koleston”! – e eles seguem passando a mão e comentando como é diferente.
Falei para eles sobre “escravos de Jó”, a maioria sabia a música, mas nem todos conheciam a brincadeira – cantar e passar um objeto de um para outro e quando alguém erra sai da brincadeira. Resolvi fazer uma releitura das regras do jogo. - ninguém sai da brincadeira quando erra, o objetivo é fazer com que todos aprendam a jogar e termina quando todos acertam.
Sentados no chão da sala de aula, com caixas de fósforos vazias, começamos a jogar. Alguns alunos, por não saberem, ou por timidez não querem participar. Tento fazer com que entrem na brincadeira, explico que todos devem ter a paciência de Jó, que estamos na escola para aprender, ninguém nasce sabendo etc. etc.
Consigo convencer um menino - aquele bem miudinho que acorda as 4 da manhã e caminha, com uma lanterna, durante uma hora pelo meio do mato junto com o irmão, pega um barco e navega por mais uma hora até chegar a escola. Ele é muito tímido, tem uns olhos pretos como jabuticaba, senta na primeira fila e me olha com uma mistura de respeito e desconfiança, dificilmente ouço sua voz - até que finalmente ele se dispõe a jogar.
As crianças, em círculo, sentadas no chão, de pernas cruzadas ou ajoelhadas jogam, brincam, brigam, gritam como crianças que são. O menino tímido fica de cócoras, não desgruda os pés do chão, não reparo nisto, mas os colegas reparam e rindo e debochando falam:
- Ele não senta porque o sapato dele está furado e vai aparecer! – todos riem e dão gargalhadas. O menino, que estava começando a jogar e gostando do jogo, levanta e vai sentar em sua cadeira.
- Professora, deixa a gente sair, já bateu para o recreio e eu to tremendo de fome!
ps.: alguns professores estão há quase um mês sem receber salários e um possível desvio da verba da merenda escolar está sob investigação.
Oh minha amiga como é triste isso não é. Apesar das várias lições que tiramos com cada história de vida dessas crianças, não deixa de ser triste. Não devia ser assim não é mesmo. Linda sua missão!
ResponderExcluirQue Deus te ilumine sempre!
Beijo no coração, e apareça.
Ai minha querida que bom sentir tua emoção aqui do outro lado ! Que bom estas crianças terem dificuldades para valorizarem e/ou trabalharem o que tantas outras nem sabem direito o que tem ! Que mundo é este ?!
ResponderExcluirE tem também você como testemunha !
Continue em sua jornada, mais emoções te esperam. Beijos fiquem com toda proteção divina.
Jane online
Devia haver uma lei contra crianças sofrerem qualquer tipo de tristeza. E devia haver uma lei que fizesse com que essa e outras leis fossem cumpridas. Beijos, minha querida!
ResponderExcluirTadinha da criança. Senti um aperto no peito ao ler a história. Quando defendem que corrupção deveria ser um crime hediondo é por sérias razões, porque de fato é monstruoso. Desviar verba da merenda escolar não é algo hediondo? Aqui em Rondônia, 13 pessoas, inclusive tendo como chefe o presidente da Assembléia Legislativa - a casa do povo- foi preso por usar mal o dinheiro do SUS! Absurdo. Quem deveria cuidar do nosso bem estar, do que "garante" a Carta Magna, estão nos surrupiando, nos tirando a dignidade.
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